Noruega como fórmula energética da Europa: Um jogo de soma variável

As necessidades europeias têm sido alvo de uma reconfiguração permanente desde o início da ofensiva militar russa no território ucraniano. A visita conjunta da Presidente da Comissão Europeia e do Secretário-Geral da NATO à Noruega simbolizou a manutenção de uma política externa que coloca no centro a autonomia e a segurança dos povos no domínio da energia e inverteu a chantagem numa solução de longo prazo


Fonte: Lusa 


As interpretações sobre o conjunto de declarações da Presidente da Comissão Europeia e do Secretário-Geral da NATO, Ursula Von der Leyen e Jens Stoltenberg, no passado dia 17 de março de 2023, poderão somente incidir sobre um ângulo de alternativa energética para a Europa que tem como pano de fundo a cidade de Oslo. Acompanhados pelo Primeiro-Ministro norueguês, o percurso dos representantes na Noruega focalizou-se na visita a uma plataforma petrolífera e, volvido mais de um ano desde o início da ofensiva militar russa no território ucraniano, impõem-se a necessidade de revitalizar uma estratégia geopolítica da energia

 

A narrativa europeia, na voz da Presidente da Comissão, refere-se à Noruega como o parceiro que os Estados-Membros da União Europeia precisavam, por via do aumento da produção de gás natural de 78 mil milhões de metros cúbicos para uma margem de 90 mil milhões de metros, anexando aos resultados do presente o discurso do governo ao nível da política externa antecipava um aumento estimativo da produção de petróleo em 15% para a Noruega


“A plataforma continental norueguesa deve continuar a ser um fornecedor estável e de longo prazo e gás para a Europa num momento muito exigente”

 

O país tornou-se o central fornecedor de gás da Europa na sequência da retirada do fornecimento da Rússia e constituiu, em larga medida, um caminho de salvaguarda energética da Europa pela plataforma de gás Troll que atingiu uma margem de fornecimento de 10% do continente, não deixando de lado o Reino Unido. 

 

Fonte: Conselho Europeu 

 

Encarrega-se a visita oficial de dois dos atores mais importantes da atual configuração da ordem internacional de salientar dois eixos complementares, merecedores de um balanço sobre a multiplicidade dos agentes. Por um lado, permitiu reunir condições para o cumprimento das exigências protocolares entre agentes supranacionais e, por outro, promoveu uma função simbólica e de cooperação entre Estados ao reconhecer a Noruega como uma potência crucial da resposta energética da Europa ao monopólio incitado pela chantagem estratégica da Rússia sobre os países que estão a apoiar a Ucrânia. Entre os Estados-membros da União Europeia e da Aliança Atlântica existem objetivos transversais à proteção das infraestruturas críticas dos Estados, em particular as submarinas, sobre as quais Stoltenberg confirmou uma atuação monitorizada e imediata por parte da NATO, reforçando a posição de resiliência do Ocidente. 


O posicionamento da Noruega, no domínio geoestratégico e em relação à União Europeia, deverá cumprir um diagnóstico que ultrapasse as projeções da política doméstica. Ainda que a tenha sido recusada por duas vezes consecutivas adesão da Noruega à União Europeia através do referendo popular, o alinhamento em matérias de política externa e apoio ao sistema multilateral está eminentemente consolidado na Política Externa de Segurança Comum e formalizam uma outra frente de cooperação no Conselho Euro-Ártico de Barents. Face à tentativa empoderamento russo, as condições de diálogo do presente são passíveis de estabelecer traços de identidade com a suspensão do fornecimento de gás natural para a Ucrânia em 2009 – enquanto o processo de abastecimento tinha continuidade no restante espaço europeu – devido a uma interrupção negocial que permeou um crise comercial de longa duração.  

 



Fonte: Cartoon Movement 

 

Os argumentos do realismo, quando aplicados à crise energética que emerge entre os Estados, recaem sobre uma capacidade empática que conduz os detentores do poder a categorizar a anarquia como uma variável constante. Com efeito, o enfoque na proteção das infraestruturas críticas dos Estados determina uma relação de interdependência com a autonomia, justificando o aumento da presença da NATO no Mar Báltico e no Mar do Norte e o triângulo de defesa estabelecido em 2022 através das contribuições militares dos aliados Alemanha, França e Reino Unido em matérias de defesa, águas comuns e recursos energéticos. 

 

Como referido por Ulf Sverdrup, a guerra mudou o sentimento político: questionou o vigor das alianças e redefiniu as prioridades da política externa dos Estados. Os períodos de turbulência incumbem-se de permitir a transição - por escolha e/ou por obrigação – que deixam a linha de atuação da Europa flexível ao nível da energia. A manutenção da colaboração poderá estender-se para além dos limites da satisfação das necessidades energéticas em sentido restrito e as conversações anunciam uma cooperação pela energia verde, como a aliança que engloba a União Europeia e o Japão. 

 

As expectativas sobre a longevidade de uma política externa de convergência sobre os Estados-membros e os seus parceiros, onde se insere a Noruega, são elevadas e refletem um simbolismo duplo: o combate à incerteza dos povos em matérias de segurança energética e o ponto de partida um futuro de estabilidade, progresso e sustentabilidade para o projeto europeu. As demandas racionais caminham para um jogo de soma variável: onde todos ganhamos conjuntamente. 

 

 


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